segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Por que mudei de opinião sobre homeopatia

por Edzard Ernst
Tradução: Felipe Nogueira Barbara
Fonte: The Guardian

Homeopatia me intriga por vários anos; de certa forma, eu cresci com ela. O médico da nossa família era um homeopata, e meu primeiro trabalho como médico júnior foi em um hospital homeopata alemão. Nas últimas duas décadas, eu investiguei homeopatia cientificamente. Durante esse período, a evidência tornou-se mais e mais negativa, e agora está bem claro que remédios homeopáticos altamente diluídos são puramente placebos. 

Dois axiomas principais constituem os princípios centrais da homeopatia. O princípio "similar cura similar" afirma que, se uma substância causa um sintoma (p.e., cebola faz meu nariz escorrer), então essa substância pode curar uma doença que é caracterizada por nariz escorrendo (p.e, alergia ou resfriado comum). O segundo princípio assume que o processo de diluição serial usada para remédios homeopáticos tornam-os não menos mas mais potentes (por isso homeopatas chamam esse processo "potenciação"). 

Ambos axiomas são contrários à ciência. Se fossem verdadeiros, muito do que aprendemos em física e química estariam errados. Se uma pessoa mostrar que os conceitos da homeopatia estão corretos, ela se torna uma séria candidata a um ou dois prêmios Nobel. Homeopatas frequentemente dizem que apenas não descobrimos como a homeopatia funciona. A verdade é que sabemos que não há explicação científica concebível que poderia explicar a homeopatia.

Ainda assim, como médico aproximadamente 30 anos atrás, eu estava impressionado com os resultados alcançados pela homeopatia. Muito dos meus pacientes pareciam melhorar dramaticamente após receberem tratamento homeopático. Como isso era possível? 

Para entender essa aparente contradição, temos que dar um passo para trás e entender as complexidades da resposta terapêutica. Quando um paciente ou um grupo de pacientes recebe um tratamento médico e subsequentemente percebe melhorias, nós automaticamente assumimos que a melhoria foi causada pela intervenção. Essa falácia lógica pode ser bem enganadora e tem impedido progresso na medicina por centenas de anos. É claro que pode ter sido o tratamento - mas há também outras diversas possibilidades. 

Por exemplo, a condição pode ter melhorado sozinha. Ou o encontro entre o terapeuta e o paciente pode ter sido terapêutico sem que o tratamento tenha contribuído significativamente. Ou o paciente poderia estar com altas expectativas no tratamento que promoveu uma poderosa resposta placebo. Ou o paciente auto-administrou outros tratamentos concomitantes que causaram a melhoria. 

Por causa dessas complexidades, precisamos conduzir ensaios clínicos que diferenciam efeitos específicos e não específicos de um tratamento. Em tais estudos, um grupo de pacientes recebe tratamento experimental (p.e, tratamento homeopático) e outro grupo recebe um placebo. Se bem desenhados, esses estudos expõem o grupo experimental aos efeitos específicos mais todos os efeitos não específicos de uma intervenção, já que o grupo controle é exposto precisamente a mesma variação e quantidade dos efeitos não específicos, mas não ao efeito específico do tratamento que está sendo testado. Nessa situação, qualquer diferença de resultado em os dois grupos foi causada por efeitos específicos.* 

Aproximadamente 200 ensaios clínicos de remédios homeopáticos estão disponíveis até hoje. Com um número dessa grandeza, não é surpreendente que os resultados não são inteiramente uniformes. Seria fácil "contar cerejas" e selecionar apenas os achados que a pessoa já gosta (e alguns homeopatas fazem justamente isso) Mas, se quisermos saber a verdade, precisamos considerar a totalidade dessa evidência e pesá-la de acordo com o seu rigor científico. Essa abordagem é chamada de revisão sistemática. Mais de uma dezena de revisões sistemáticas de homeopatia já foram publicadas. De forma quase uniforme, eles chegaram a conclusão que remédios homeopáticos não são diferentes de placebo.

Muitos homeopatas aceitam relutantemente esse cenário, mas afirmam que a experiência clínica deles é mais importante que a evidência de ensaios clínicos. Pacientes que consultam homeopatas ficam melhores e estudos observacionais mostraram isso ad nauseam. Homeopatas insistem que isso é uma evidência que é mais importante daquelas oriundas de ensaios clínicos. Mas há realmente uma contradição? 

A experiência é real, é claro, mas não estabelece causalidade. Se dados observacionais mostram melhorias enquanto ensaios clínicos nos dizem que remédios homeopáticos são placebos, a conclusão que encaixa confortavelmente com esses fatos é a seguinte: pacientes melhoram, não pelo remédio homeopático, mas por um efeito-placebo e por uma consulta demorada com um clínico compassionante. Essa conclusão não é apenas lógica, é também apoiada por dados. Homeopatas de Southampton demostraram recentemente que é a consulta, e não o remédio, o elemento que melhora os resultados clínicos de pacientes após consultarem um homeopata. 

Um dos meus professores na escola de medicina vivia nos dizendo: "Qualquer tratamento que não faz mal aos pacientes não pode ser tão ruim". Como não contém nenhum ingrediente ativo, remédios homeopatas altamente diluídos são livres de efeitos colaterais. Então, por essa perspectiva, homeopatia pode ainda ser aceitável. Esse talvez seja o debate mais difícil sobre homeopatia; há obviamente argumentos razoáveis de todos os lados. Mas antes de definir sua opinião, considere os seguintes aspectos:

- Efeitos placebo são notoriamente não confiáveis; pacientes que se beneficiam hoje pode não se beneficiar amanha. Efeitos placebo tendem a ser pequenos e de curta duração. 

- Prescrever conscientemente placebo aos pacientes seria antiético na maioria dos casos. Ou o clínico fala a verdade (p.e, "isso é um placebo"), no qual o efeito provavelmente desaparecerá, ou eles não falam, onde são mentirosos. 

- Prescrever placebo para um paciente com uma séria condição que é tratável de outra maneira coloca seriamente a saúde desse paciente em perigo. 

- Para promover uma resposta placebo em um paciente, não precisamos administrar um placebo. Todos os tratamentos vem com a cortesia do efeito placebo desde que os clínicos administrem-os com compaixão e empatia. Então, por que confiar apenas na parte da resposta terapêutica?  Isso não é ruim para o paciente? 

Minha jornada pessoal dentro e fora da homeopatia pode ser confusa. Eu sempre soube que os princípios da homeopatia são contrários à ciência. Mas eu via resultados positivos e pensava que havia algum fenômeno fundamental a ser descoberto. O que eu descobri não foi fundamental mas mesmo assim importante: pacientes podem apresentar melhorias oriundas de efeitos não específicos. Isso é a razão pela qual eles melhoram após se consultarem com um homeopata - mas isso nada tem a ver com os comprimidos de açúcar da homeopatia.  

*Nota do Tradutor: Um ensaio clínico bem desenhado é randomizado e, no mínimo, duplo cego. Randomizado quer dizer que os pacientes são aleatoriamente distribuídos entre os grupos placebo e tratamento. Quando o paciente não sabe se ele está no grupo placebo ou tratamento, mas o médico sabe, o estudo é cego. É necessário cegar o paciente, já que, se o paciente sabe que está recebendo um placebo, há grandes chances do efeito placebo desaparecer. Quando o médico e o paciente não sabem quem está em qual grupo, o estudo é duplo-cego. A necessidade de cegar o médico se deve ao fato que, ao saber quem está tomando placebo ou não, ele pode introduzir um viés, submetendo os grupos a diferentes efeitos não específicos. Há ainda o estudo triplo-cego:  paciente, o médico e o estatístico não sabem quem está em cada grupo, aumentando a imparcialidade na análise dos dados. Por fim, um estudo quádruplo-cego oculta a identificação dos grupos também para os responsáveis por escrever os resultados até o término do rascunho. A maioria dos ensaios clínicos bem desenhados que testam eficácia de um tratamento (com dois ou mais grupos, sendo um placebo) são duplo-cego.     



2 comentários:

  1. A doutrina espírita, apresentada por Kardec, é a chave para entender e aceitar o tratamento homeopático. É necessário estudar termos que a medicina convencional não aceita, como perispírito, ectoplasma, energia vital, etc..Temos uma carta do espírito de Hahnemann à Karde, publicada na Revista Espírita que esclarece muito. A origem de muitas doenças está no psiquismo espiritual, que reflete no corpo somático.

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  2. A doutrina espírita, apresentada por Kardec, é a chave para entender e aceitar o tratamento homeopático. É necessário estudar termos que a medicina convencional não aceita, como perispírito, ectoplasma, energia vital, etc..Temos uma carta do espírito de Hahnemann à Karde, publicada na Revista Espírita que esclarece muito. A origem de muitas doenças está no psiquismo espiritual, que reflete no corpo somático.

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